OS HOMENS DO
ORIENTE
Autor desconhecido
Personagens:
Gaspar
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Melchior
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Baltazar
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Pastor
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Guarda
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1º homem
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2º homem
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Comerciante
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Hospedeiro
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Felipe
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Judite
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Aman
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Tiago
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Simão
|
Ruth
|
Senhora
|
Locutor
|
|
Gaspar: Chega!
Nem um passo mais!
Melchior: Jerusalém!
Baltazar: Ali
está Jerusalém!
Gaspar: Doem-me
os pés Melchior. Vocês, venham cá e sentem-se debaixo desta figueira. Até
Jerusalém levaremos ainda uma hora.
Melchior: Atravessando
este vale estaremos lá, Gaspar. Sem dúvida a estrela nos trouxe a esta cidade.
Gaspar: Setenta
dias e setenta noites de caminhada...
Baltazar: E se a
estrela nos enganou, Melchior?
Melchior: Mas tu
não ouves o barulho das ruas da cidade?
Baltazar: Tudo
isso em honra ao rei que acaba de nascer! Parece música.
Gaspar: Experimenta
estes figos, estão gostosíssimos”
Baltazar: Eu
gostaria de voltar...
Melchior: Deixa
disso. Vamos lá!
Baltazar: Que
será ao vermos que não é aqui! Não vamos encontrar a quem procuramos. Esta é
uma cidade como tantas outras. A nossa
viagem foi em vão!
Melchior: Ela não
foi em vão! (Com ênfase) Uma cidade
como esta não se encontra duas vezes no mundo. Os seus sábios, os seus artistas
são famosos de Roma até o Oceano Índico.
Baltazar: Sim,
sim. Os seus mercadores vinham até nós e levavam o nosso ouro e nossas pedras
preciosas.
Melchior: Isso
foi no passado. Eu já conhecia esta terra antes. Grandes guerras a arrasaram.
Todos sabiam: Algo de novo virá! Precisa vir! Porque Deus haverá de lavrar a
terra para lançar nova semente.
Gaspar: E agora
vimos a sua estrela
Melchior: Por
isso, deve ser aqui...
Gaspar: Afinal,
porque Baltazar veio conosco? Sempre com essa idéia de voltar e não acreditar
no que dizem os sinais.
Baltazar: Por
favor, me entendam. Procuro e espero o rei com tanta ansiedade quanto vocês!
Sim, o rei mudará tudo... e tudo será diferente. Ninguém mais será afugentado de sua casa por
ser de outra cor ou por Ter outros pensamentos. Não haverá mais inimizade. Mas
eu tenho medo, medo de que aqui seja como em outras cidades.
Melchior: Nós
acharemos o rei recém-nascido, aqui em Jerusalém.
Baltazar:
Surgiram tantos reis falsos. Como vamos poder reconhecer se realmente é o
verdadeiro’
Melchior: Ora,
pelos homens que o seguem. Vem Gaspar, vamos caminhando.
Gaspar:
Caminhamos tanto. Será que não poderíamos descansar? Realmente, experimentes
estes figos... São gostosos... Vocês não estão com fome’
Melchior: Nós
vamos encontrar uma hospedaria...
Gaspar: Bem,
então vamos...
Pastor: Para onde
os senhores vão?
Melchior: O
senhor é desta região?
Pastor: Não
senhor. Algumas vezes eu pastoreio minhas ovelhas na região de Belém.
Baltazar: O
senhor poderia nos mostrar o caminho de Jerusalém?
Pastor: Por ali
há um atalho. Ali está o Getsêmani. É por ali que passa o caminho. É o único.
Baltazar: Obrigado
velhinho.
Pastor: Paz seja
convosco.
Gaspar: Está
escurecendo. Ali, olhem... a nossa estrela, lá!
Melchior: Dentro
de pouco tempo estaremos lá. (Ao saírem,
apaga-se a luz. O pastor volta ao seu lugar. Quando a luz acende, os três
entram pelo mesmo lado pelo qual saíram. O guarda entra pelo lado oposto. O
guarda fala militarmente).
Guarda: Quem são
vocês? De onde vem? O que querem em Jerusalém?
Baltazar: Nós
somos viajantes do Oriente.
Guarda: Que
mercadoria vocês estão trazendo?
Baltazar: Apenas
presentes para um recém-nascido. Estamos a sua procura.
Melchior: Viemos
para adorá-lo.
Gaspar:
Mostre-nos o caminho, por favor.
Guarda: Um
recém-nascido? Aqui reina o rei Herodes, há mais de trinta anos. Aqui não
nasceu rei nenhum...
Baltazar: Não?!
Gaspar: Certamente
o guarda ainda não sabe nada...
Baltazar: Não
saber que nasceu um rei? Claro que deve saber!
Guarda: Eu tenho
ordem de guarnecer o portão de Jerusalém. Além disso, nada mais. Por isso, não
me interessa se nasceu ou não um novo rei.
Baltazar: Mas
isso é algo extraordinário...
Guarda: O que é
importante, nós guardas sabemos. Nada nos foi comunicado. Portanto, não há novidade.
Melchior: Talvez
o novo rei não seja da casa de Herodes, mas sim de uma outra. Nós mesmos procuraremos.
Guarda: Vou
transmitir a intenção de vocês. Podem entrar. (O guarda volta ao seu lugar).
Gaspar:
Esquecemos de perguntar por uma hospedaria.
Melchior: Há
muita gente a quem podemos perguntar.
Baltazar: Gaspar,
Melchior, não vejo mais a estrela!
Gaspar: Baltazar
tem razão...
Baltazar: Ela
desapareceu desde que entramos na cidade.
Melchior: Nós já
vamos achá-la novamente.
Baltazar: Melchior,
vamos voltar ( em tom de lamento)! Ele não está aqui. (O 1º homem levanta-se do seu lugar e passa apressadamente. Pode estar
sentado na platéia e estar no palco).
Gaspar: Aí vem
vindo alguém...
Melchior: Com
licença, uma palavrinha só...
1º Homem: Que é
que há?
Baltazar: Procuramos
o rei recém-nascido...
1º Homem: Rei?
Céus... Diariamente nasce um rei: reis de futebol, reis do box e muitos outros.
Portanto, meu amigo, é só escolher!
Baltazar: Estão
vendo, este também não sabe de nada.
Melchior: Não, eu
acho...
1º Homem: Ah,
eu não posso esquecer o rei dos
velhacos, dos gatunos e patifes. Desculpem-me, lamentavelmente não tenho tempo
para conversas fiadas.
Gaspar: Calma, espere
um pouco... (1º Homem sai).
Baltazar: Por que
estará tão apressado?
2º Homem: (Entra apressado também).
Melchior: Ei, bom
amigo...
2º Homem: Não
tenho tempo, preciso ir ao templo.
Gaspar: Sim. Sim!
Ele certamente deve estar lá.
2º Homem:
Exatamente, um famoso pregador falará. Preciso me apressar. O templo está
sempre lotado. Desculpem-me, senão não conseguirei mais lugar. (2º Homem sai).
Gaspar: Será que
ele é tão religioso quanto aparenta?
Baltazar: Também
esse não sabia de nada. Eu não disse?
Melchior: Vamos
perguntar adiante. (O comerciante
aparece).
Comerciante:
Comprem alguns tapetes senhores. Tapetes da pérsia, tecidos da Índia. Ali está
a minha loja. Entrem lá e escolham. (O
comerciante leva alguns tapetes na mão, como mostra do produto. À medida que
vai falando, vai largando alguns tapetes aos pés dos homens do Oriente).
Baltazar: Não
procuramos nem tapetes, nem tecidos...
Melchior:
Procuramos o novo rei!
Comerciante:
Misericórdia! Um novo rei! Já temos trabalho sufocante com os nossos negócios. Não
precisamos de um novo rei... Aproveitem
e comprem tecidos da Arábia, tapetes da Pérsia. Estamos contentes porque tudo
está calmo novamente. Outros reis tem outras idéias e novas idéias geram
conflitos e agitação. Não queremos saber de novos reis... comprem tapetes...
Melchior:
Mentiroso. Aqui aconteceu algo. Pois, ao contrário as pessoas que encontramos
não teriam tanta pressa. Para onde estão indo? Uns mais apressados do que
outros...
Comerciante: Sei
lá! Negócios, talvez. Aqui sempre é assim.
Baltazar: Nós
pensávamos que a cidade estava em festa. Ao invés disso, encontramos os gritos
e berros de comerciantes e propagandistas.
Comerciante:
Comprem tapetes, senhores. Da Pérsia, tecido da Índia, preciosidades da Arábia...
Baltazar: Não
queremos comprar!
Comerciante:
Gente implicante, essa! (Sai. Enquanto
isso, o hospedeiro coloca uma mesa e cadeiras no palco).
Gaspar: Ali...
uma hospedaria... o hospedeiro está colocando uma cadeiras... Melchior,
Baltazar, caminhamos o suficiente hoje.
Vamos descansar um pouco. Além disso, tenho fome, muita fome...
Melchior: Bem...
Gaspar: Talvez
achemos também uma pousada...
Baltazar: Mas
somente por essa noite. Amanhã bem cedo voltarei para minha casa. (Vão até a mesa e sentam-se. Colocam suas
mochilas no chão).
Hospedeiro: O
Senhor seja convosco. Bem-vindos. A minha casa é a vossa casa. Os senhores não
querem vir até a cozinha e porão, que estão em condições de servir?
Gaspar: E o que
há nesta cozinha e nesse porão?
Hospedeiro: Tenho
assado de ovelhas, cuca, vinho do Vale do Jordão... Garanto que vocês vão
gostar...
Gaspar: Espero
que assim seja. Traga-nos algo para beber.
Baltazar: Acho
que a estrela nos enganou...
Melchior: Ela não
nos enganou. Nós todos vimos...
Baltazar: Então
me diga onde é que ela ficou? Sumiu! Não encontramos nada aqui além do que poderíamos
encontrar em outros lugares. Nada, nada, nada...
Melchior: Nem
tudo pode estar errado, pois nós só vimos a menos parte da cidade. Há ainda
outras vilas, outras ruas e outras pessoas. Vamos procurar adiante. Tenho um
amigo aqui em Jerusalém, Felipe. (O pastor entre, se aproxima da mesa e
começa a falar).
Pastor: Então,
senhores, encontraram o que estavam procurando?
Baltazar: Sim, o
caminho que nos trouxe até a cidade. Além disso, nada!
Pastor: Se eu
pudesse ajudá-los... (O hospedeiro se aproxima com a jarra e enche os copos9
Hospedeiro: Este
vinho é de primeira. Do Vale do Jordão. Doce como o mel, forte como o sol, fresco
como o luar.
Gaspar:
Vejamos...
Hospedeiro: (Ao pastor) Não fique aí parado,
velhinho!
Pastor: Eu sei!
Hospedeiro:
Desapareça daí!
Melchior:
Hospedeiro, o senhor conhece um homem chamado Felipe? Ele era auxiliar de um
negociante de especiarias...
Hospedeiro:
Felipe? Não será o grande Felipe? Oh, este não trabalha mais com ninharias. Ele
possui inúmeras caravanas que transportam mercadorias do Egito até a Índia. É
dono de um palacete situado á beira da estrada que vai para Damasco.
Gaspar: Ele sem
dúvida deve saber se há novidades aqui ou não.
Hospedeiro:
Felipe é a pessoa de maior influencia aqui. Metade de Jerusalém lhe pertence. (Ao pastor). Você ainda está aqui? Não
ouviu o que lhe disse?
Pastor: Ao menos
dê um copo de água para mim senhor. O
dia está muito quente...
Hospedeiro: Peça
aos seus anjos! Eles lhe darão água! Suma daqui! Eu estou lhe avisando pela última vez...
Gaspar: Aqui,
tome um copo de vinho...
Pastor: Muito
obrigada , senhor...
Hospedeiro: Está
bem, mas agora trata de desaparecer da minha frente, senão...
Pastor: Paz seja
convosco. (Sai)
Hospedeiro: Vou
dar uma olhada no assado de ovelha... Vocês vão se admirar... Deve estar quase
pronto! Ah...
Gaspar: Devíamos
ter perguntado ao pastor. Quem sabe ele poderia
ter dito alguma coisa...
Baltazar: O que
pode saber um simples pastor?
Melchior: Amanhã
procuraremos em toda a cidade. Irei à casa de Felipe. Ele nos ajudará.
Baltazar: Eu não
quero mais saber de nada. Eu desisto.
Melchior: Fique
Baltazar, ao menos mais um dia... Eu sei que vamos achá-lo
Gaspar: Já que
estamos aqui...
Baltazar: Eu sei,
eu sei, mas é tudo em vão...
Melchior: Fique, nós tentaremos...
Baltazar: (Convencido) Bem, mais um dia... (A luz se apaga. Quando se acende novamente,
Melchior está de frente para o público. Felipe coloca a mesa no palco, juntamente a uma cadeira, um pouco afastada
da mesa. Felipe senta-se e lida com papéis. Enquanto Felipe troca o cenário, Melchior
fala ao público).
Melchior:
Continuaremos procurando nesta cidade pelo rei, cuja estrela nós vimos. Irei à
casa do mercador Felipe. Vejo a sua casa, rodeada por um rico jardim. Há poucos
momentos chegou uma caravana de 40 camelos. Os trabalhadores carrega a
mercadoria. Ele está sentado contando os saco trazidos pela caravana. Vou
entrar. (Felipe levanta-se da cadeira
com uma bolsa na mão e está fazendo apontamentos).
Felipe: 30, 31,
32, 33, 34...
Melchior: Felipe!
Felipe: 35, 36,
37... não vês que estou ocupado? 38, 39... se o senhor tiver alguma oferta, não
estou interessado, não tenho
necessidade.
Melchior: Meu
nome é Melchior, venho do Oriente.
Felipe: Pode
ser... 40, 41... Já tivemos alguma correspondência?
Melchior: Há
muito tempo éramos amigos...
Felipe: Como é
mesmo o seu nome? Melchior?... Sim, eu me lembro. Faz muito tempo, não? Alegra-me ver-te. Como
vai você? Você teve muita sorte em me encontrar. Lamentavelmente logo
precisarei sair. 43, 44, 45... o que o traz aqui’
Melchior: Procuro
o rei recém-nascido.
Felipe: Sim, sim,
46, 47, 48, 49... Não, você fala sério?
O que você faz aqui em Jerusalém?
Melchior: Procuro
o novo rei dos judeus.
Felipe: Não faça
brincadeiras...
Melchior: Não,
nós vimos a sua estrela e estamos aqui para adorá-lo.
Felipe: Então,
eu... 50, 51...
Melchior: Ainda
não conseguimos encontrá-lo. Tu conheces Jerusalém. Não ouviste nada a respeito!
Felipe: Ouvir? De
que? Ah, sim, não! Nada, 52, 53, 54...
só sei que há muito movimento devido ao
recenseamento e é só. É uma loucura dos romanos. Todas as ruas estão entupidas.
Bom, quem viaja muito sempre gasta alguma coisa e para mim isso já é positivo.
52, 53, 54, 55... Vou abrir três bazares: em Javá, em Belém e Hidron.
Melchior: E não
houve nenhum comentário?
Felipe: Nenhum,
pode estar certo. Nesta cidade não acontece nada sem que nós comerciantes não
soubéssemos. Pois é, console-se, logo entraremos em negociações.
Melchior : Mas
Felipe, quem está falando em negócios?
Não são negócios que me trazem a Jerusalém.
Felipe: Isso eu
sei. Vocês do Oriente sempre começam dessa maneira: nos contam as mais variadas
histórias . 56, 57... e depois nos passam a perna... este arroz é o melhor que
há! Nenhum outro comerciante de Belém tem tantas qualidades como eu!
Melchior: Felipe,
ouça-me, por favor. Em todos os recantos do mundo sabe-se que algo de novo
virá, qualquer coisa, mas o quê? De onde? Por isso nós estamos em Jerusalém.
Felipe: Bem, aqui
não se vive mal... 58, 59, 60, 61... muitas coisas mudaram nos últimos tempo,
não é? Isso me orgulha! Você viu os meus jardins? Lindos, não?
Melchior: Sem
dúvida. Isso é magnífico, mas...
Felipe: É,
naturalmente isso não caiu do céu. Preguiçoso aqui não pode viver. Além disso, faz-se muitas coisas para as
pessoas que estão bem de vida.
Melchior: Em
outros lugares se faz muito mais! Não é isso! Os nossos corações é que estão
vazios e não as nossas mãos! Creia-me, procuramos o rei! Ajude-nos Felipe!
Felipe: 62, 63...
Judite: Felipe,
Aman de Hidro está aí.
Felipe: Não estou
em casa.
Judite: Mas ele
sabe que você está.
Felipe: Não tenho
tempo, preciso sair logo, além do que, tenho visitas, como você pode ver.
Judite: (A Melchior). Eu vi quando o senhor
chegou. (A Felipe) Mas o que será de
Aman? Você não pode mandá-lo embora...
Felipe: (Irritado) Não permito que minha esposa
se meta nos meus negócios. Não tenho tempo, diga isso a Aman.
Judite: Bem, se
você quer assim...(Sai)
Felipe: Horrível.
Todos querem alguma coisa. Pois é, Melchior, gostaria muito de te ajudar.
Realmente não faria mal se viesse outro rei. Talvez ele reduziria os impostos.
Quanto imposto você acha que eu pago por esses 60 sacos de arroz?
Melchior: Você
não me entende, Felipe. Você não recorda mais dos tempos que conhecíamos todos
os filósofos gregos e romanos? ... Como falávamos que algo novo deveria vir,
logo e que então nunca mais seria como o passado?
Felipe: Mas isso
foi há muito tempo...
Aman: (aparece) Felipe...
Felipe: Aman, o
que você quer? Você não ouviu que estou ocupado? Hoje não tenho tempo.
Aman: Só um
momento. Eu preciso de dois sacos de arroz e um de farinha para esta semana.
Felipe: E isso
precisa ser já?
Aman: Eu sempre
vinha a esta hora.
Felipe: Eu tenho
um hóspede...
Melchior: Eu vou.
Felipe: Fique.
Ele deverá ir.
Aman: E aqui
outro pedido...
Felipe: Não posso
fornecer...
Aman: Não pode
fornecer? Mas o depósito está cheio até em cima!
Felipe: Isso não
é da sua conta...
Aman: Eu preciso
de mercadoria. Do contrário vou perder a minha freguesia.
Felipe: Lamento
muito. Além disso, eu mesmo vou abrir um mercado em Hidron.
Aman: Felipe!
Felipe: Venha,
Melchior. Vamos ao jardim.
Aman: Isso não
pode ser verdade!
Felipe: Você acha
que eu minto?
Aman: Então nós
estaremos perdidos!
Felipe: Lamento
muito. Então você acha que eu vou esperar que outro faça isso em meu lugar?
Aman: Você,
Felipe, exatamente você precisa fazer isso?
Felipe: Por que
vocês não o fizeram, seus sábios comerciantes de Hidron?
Aman: Ninguém é
tão rico como você!
Felipe: Rico?
Preguiçosos é que vocês são. Preguiçosos. Pensaram em passar a vida sem fazer
nada. Este tempo passou.
Aman: Eu... eu...
(a Melchior) Senhor, eu... eu não o
conheço, ... mas o senhor ouviu. Eu lhe peço: faça algo por mim. Eu tenho
filhos.
Melchior: Se eu
pudesse lhe ajudar...
Aman: Felipe, seu
negócio já não é grande suficiente? Por que você quer aumentá-lo sempre mais?
Sempre mais e mais? Tenha misericórdia, Felipe!
Felipe: E quem
tem misericórdia de mim? Por acaso você está vendo estes sacos de arroz? Estes
fardos de lã? Você acha que eu consegui isso sem mais nem menos? Custaram-me muitos denários. De uma maneira
ou outra eu preciso progredir antes que os outros acabem comigo.
Aman: Mas por que
tudo isso? Por que?
Felipe: Porque é
assim e assim que deve ser. Aqui não existe porquê!!!
Judite: (Entra) Felipe eu ouvi tudo...
Felipe: Isso não
é da sua conta, portanto, não se meta.
Judite: Há muitos
anos que Aman é seu amigo...
Aman: Durante 20
anos eu vinha semanalmente e comprava as mercadorias.
Judite: Vocês
brincavam como crianças no pátio do templo. Os pais de vocês eram bons
amigos...
Felipe: Nesse
caso, não preciso ter amigos. E nem
posso. Amigos, amigos, negócios à parte. Onde se negocia, o sentimento e o
coração precisam ficar de fora.
Aman: Não vou
ficar quieto. Não! Vou gritar pelas ruas e anunciar que Felipe é assassino!
Felipe: (Sacudindo-o) Isso você não vai fazer.
Você conhece o comerciante de Hidron.
Aman: Você também
acabou com ele...
Felipe: Comprei a
empresa dele. A este negócio pertencem algumas promissórias de Aman de Hidron.
Eu seria capaz de rasgá-las. Mas se você
falar muito...
Aman: (Soltando-se) Faça o que você quiser... (Sai)
Judite: Felipe,
não deixe que ele vá embora. Aman é seu melhor amigo.
Felipe: Ele é um
palhaço. Não conhece os sinais dos tempos. Hoje em dia é preciso trabalhar com
muito lucro para não ir à falência.
Judite: Melchior,
peça-lhe para chamar Aman de volta.
Felipe: Isso eu
não admito. Você também quer se intrometer nos meus negócios Melchior?
Melchior: Eu não
disse nada...
Felipe: Eu quero
dizer uma coisa, seu santo que fala de tempos passados, novos reis e outras
coisas mais. Coma ou você será devorado. Sim, senhor. É assim mesmo. Sim, sim,
já sei o que você... vai dizer...
Melchior: Não vou
dizer nada.
Felipe: Vocês não
precisam me censurar, exatamente vocês...
Melchior: Eu
admiro você, Felipe.
Felipe: Por que?
Melchior: Você
não tem medo de que alguém lhe apresente um recibo que não pode ser resgatado
com arroz ou lã?
Felipe: Eu não
fiz nada de ilegal. Ah, o que estamos
dizendo? Nem vale a pena pensar nisso. Felizmente também não há tempo. Bom,
preciso ir.
Judite: Fique
,Felipe.
Felipe: Melchior
fica. Vocês podem trocar idéias e renovar o mundo com os sonhos de vocês. Enquanto
isso vou tratar dos meus negócios, pois precisamos viver.
Judite: Fique
Felipe.
Felipe: Não
posso, é importante, passem bem. (Sai)
Judite: Oh, é
importante... (senta-se na cadeira de
Felipe). É sempre tão importante que não resta tempo para conversarmos.
Antigamente a casa estava sempre cheia de amigos, mas agora... (Apaga-se a luz. Quando acende, Baltazar
encontra-se no palco).
Baltazar: Não
deveríamos Ter ido aos comerciantes. Por isso vou tentar com os escribas. Eles
são os professores do povo e conservam os livros. Se há realmente um novo rei,
então eles devem conhecê-lo.
Tiago: Não, não,
Simão, esse Jeobeão tem cada idéia...
Simão: Talvez,
Tiago, mas cada um pensa o que quiser, pois é livre.
Tiago: Cá entre
nós, Simão: diz-se que ele tem relações secretas com os persas.
Simão: Não ouvi
falar nada, será que isso está provado?
Tiago: Simão, eu
o admiro. Eu pensava que você fosse um dos nossos.
Simão:
Naturalmente, eu só acho...
Tiago: Além de
tudo ele quer assumir um posto na administração do nosso município.
Simão: Sim, você
tem razão. Talvez seria bom falar com Jeobeão, se pudéssemos convencê-lo...
Tiago: Falar com
ele por quê? Ele tem um mercado na estrada que vai para Javá ... deveríamos
falar, mas com cuidado...
Simão: Deveríamos
convencer nossos amigos a não comprarem mais no mercado dele. Vai ver como ele
muda de idéia.
Tiago: Se você
acha... (Baltazar entra)
Baltazar:
Saúdo-vos irmãos!
Tiago: Seja
abençoado. Em todos os casos esse
Jeobeão é um louco, precisamos fazer alguma coisa...
Baltazar: Eu vim
procurar um novo rei...
Simão: De onde
você vem?
Baltazar: Eu
venho das terras do Eufrates e do Tigre. Eu procuro...
Tiago: Parece que
há muita desordem por lá. Aqueles povos são dignos de compaixão. Então, satisfeito
por estar aqui?
Simão: Há muita
gente da terra de vocês aqui em Jerusalém.
Tiago: Tenha
paciência, qualquer dia as coisas vão melhorar
Baltazar: Eu
estou aqui para...
Simão: Muito
justo. Não é uma maravilha a nossa Jerusalém?
Tiago: Uma cidade
magnífica, não é? Vivemos felizes!
Baltazar: Isso eu
sei... procuro...
Tiago: Você não
sabe?
Simão: Que significa
isso?
Tiago: Se você
não gosta de nossa cidade, então vá morar em outro lugar, do outro lado do
Jordão e alimente-se de mel silvestre.
Baltazar: Não é
isso que eu procuro...
Simão: Auxílio.
Nós compreendemos. Estamos dispostos a ajudar.., não é Tiago?
Tiago:
Naturalmente, e com prazer. Exigimos apenas que você se submeta aos nossos
conselhos.
Baltazar: Que
significa isso? Eu vim porque procuro algo e vocês querem me comprar?
Tiago: Ouça só
que ingratidão. A gente se prontifica a colaborar com estes miseráveis... Você
deve compreender que nada podemos começar com pessoas que mais tarde seguem seu
próprio caminho.
Baltazar: Ouçam-me,
por favor. Eu vim procurar o novo rei. Nós vimos a sua estrela.
Tiago: Um novo
rei?
Simão: Céus! Não
sabemos de nada!
Tiago: E nós
seríamos os primeiros a sabê-lo...
Baltazar: Nós
lemos os livros de vocês e vocês também falam ali de um novo rei.
Simão: Sim, na
escritura. Certamente você não entendeu o que leu.
Tiago: Você tomou
tudo ao pé da letra...
Baltazar: Mas, é
preciso tomar tudo ao pé da letra. Senão , não teria nenhum sentido.
Tiago: Um
problema interessante. Deveríamos escrever um livro sobre isso. Bem, caro
amigo, nosso tempo está esgotado (Simão e
Tiago levantam).
Simão: Precisamos
ir à reunião. Será feita uma crítica
contra a violência.
Tiago: No outro
lado do Jordão. Você compreende? Mais
tarde, talvez.
Baltazar: Nunca
mais. Aqui eu não vou procurar o que eu procuro. Disso eu tenho certeza. (Sai).
Tiago: Você não
acha esquisita essa conversa de novo rei?
Simão: Pois é,
quem procura novidades aqui em Jerusalém é suspeito. Vamos. (Apaga-se a luz. Quando acende, Gaspar
encontra-se só no palco. Enquanto ele fala, Ruth senta-se no chão e brinca com
uma bola).
Gaspar: O rico
comerciante não sabia de nada. Os escribas muito menos ainda. Agora vou tentar
com os miseráveis, estes ao menos tem o
coração no lugar certo. Os grandes não querem saber de muitas coisas, mas os
pequenos tem compreensão para tudo.
Amon, o tecelão sabe o que se fala no tear e nas tabernas. Aqui está a sua casa. Ele não está. Mas aqui
está sua filha... está brincando...
(Aproxima-se de Ruth e fala calmamente). Eu procuro seu pai, Amon, o
tecelão. Sabes onde ele está?
Ruth: (Sem olhar
para Gaspar) Não!
Gaspar: E sua
mãe?
Ruth: Não!
Gaspar: E quando
vão voltar? Sabe?
Ruth: Não. (Gaspar vira-se para ir embora). Eu sei
onde estão.
Gaspar: Onde?
Ruth: Trabalhando.
Gaspar: Os dois?
Ruth: Sim, mamãe
volta logo.
Gaspar: Vou
esperar. Vamos brincar um pouco? (Senta-se
no chão, abre os braços esperando a bola).
Ruth: Não!
Gaspar: Eu não
vou te morder...
Ruth: Eu não
brinco com você.
Gaspar: Por que
não?
Ruth: Você não
quer me levar?
Gaspar: Eu?
Levar? Quem foi que lhe disse isso’
Ruth: Quando não
me comporto, mamãe sempre me diz que um negro vai me levar.
Gaspar: Dizem
isso na sua casa? Não, eu não quero levar você. Quero só brincar.
Ruth: Você é do
circo? (Joga-lhe a bola)
Gaspar: Não, eu
não sou do circo.
Ruth: Você não
mora na selva com as feras?
Gaspar: Mas quem
lhe contou tudo isso?
Ruth: Mamãe!
Gaspar: Moramos
em cidades como vocês. Usamos as mesmas roupas.
Ruth: Lá todos
são pretos?
Gaspar: Sim, isso
sim.
Ruth: Só os maus
são pretos?
Gaspar: Eu sou
mau?
Ruth: Não! Lá não
há feras que comem a gente?
Gaspar: Há sim,
mas não nas cidades. Somente longe, fora da cidade.
Ruth: (Aproximando-se de Gaspar) Que animais?
Gaspar: Bem, que
animais? Há, por exemplo, o leão. Você conhece?
Ruth: Não.
Gaspar: Ele tem
uma juba, como as crianças que não querem cortar o cabelo.
Ruth: Ah...
Gaspar: Quando
tem fome ele ruge.
Ruth: E quando
não tem fome?
Gaspar: Daí,
naturalmente, não.
Ruth: O que tem
mais?
Gaspar: A girafa
que tem pescoço comprido.
Ruth: Mais,
mais...
Gaspar: Tem o
elefante que tem uma longa tromba. Tem o crocodilo que mora na água...(Não notam
que a mãe de Ruth entra)
Senhora: Ruth!
Ruth: Mãe!
Senhora: Venha
imediatamente!
Ruth: Ele está
contando histórias!
Senhora: (Toma Ruth pelo braço para levá-la embora.
Gaspar levanta). Você não pode Obedecer? (Vira-se para Gaspar). Pelo menos respeite os filhos dos outros...
Gaspar: Estou à
espera de Amon, o tecelão e ...
Senhora: Então
espera em vão...
Gaspar: Talvez
ele pudesse me ajudar. Eu procuro...
Senhora: Ele não
está.
Gaspar: Vou
esperar...
Senhora: Como
quiser. Mas não na minha casa. Além disso, eu não sei o que o senhor tem a ver
com meu marido. (A Ruth) E fique
sabendo, Ruth, eu não quero que você fale com quem não conhece. Vamos lá, lavar
suas mãos!
Ruth: Minha
bola... (Gaspar lhe entrega a bola. Apaga-se a luz. Quando acende, volta a cena
da hospedaria).
Melchior: Então,
o que mais você encontrou?
Baltazar: Nada.
Pastor: Deus vos
abençoe, senhores.
Baltazar: Você
chegou em boa hora, velho. Agora mostre a saída, o mais depressa possível,
certo?
Pastor:
Encontraram o que estavam procurando?
Baltazar: Não!
Gaspar: E não
vamos procurar mais...Desistimos.
Pastor: Onde
vocês procuraram? Nas ruas iluminadas? Nos palácios? Vocês tem que procurar nos
arredores.
Gaspar: Não vamos
mais dar nenhum passo, velho.
Melchior: Falsos
reis, desses achamos um monte.
Pastor: Pastoreio
minhas ovelhas nos campos de Belém...
Baltazar: Chega,
esta história você já contou uma vez!
Pastor: Posso
mostrar o caminho que estão procurando.
Baltazar: Não
dêem atenção ao velho...
Pastor: Um anjo veio e me levou...
Baltazar: Chega e
cala a boca. Não acreditem no que ele está dizendo. Não quero ser enganado pela
Segunda vez.
Gaspar: Vem,
Melchior, nós achamos a saída sem a ajuda de ninguém.
Melchior: Deixem
ele falar. Quero ouvir o que ele tem a dizer. (O guarda aparece)
Guarda: Alto!
Vocês são os três do Oriente?
Gaspar: Somos
nós, sim, e já estamos voltando para lá.
Guarda:
Comuniquei a Herodes o que querem aqui, que estão procurando um recém-nascido.
Baltazar: Foi um
engano, realmente um engano.
Guarda: Herodes
deseja conhecê-los. Ele quer que comuniquem a ele assim que acharem o
recém-nascido.
Baltazar: Pode
falar ao seu rei que pode ficar tranqüilo.
Nada de novo aconteceu em Jerusalém.
Gaspar: Vamos.
Melchior: Muito
interessante.
Baltazar: O quê?
Melchior: Herodes
crê que poderia ser realmente verdade, senão não teria mandado o guarda.
Pastor: Venham
comigo senhores.
Melchior: Para
onde nos levas?
Pastor: É uma
casa pobre. Uma estrebaria. Uma manjedoura.
Baltazar: Que
consideração! Aqui mora-se em palácios, um maior que o outro. E o rei numa estrebaria?
Nunca, nunca, Melchior. Você não vê que ele está nos enganando?
Pastor: É um
caminho penoso...
Gaspar: A
estrela... a estrela apareceu novamente!
Baltazar: Sim!
Gaspar:
Exatamente quando o velho falou da manjedoura, ela apareceu.
Melchior: Este é
o sinal. Mostra-nos o caminho!
Gaspar: Vamos
tentar mais uma vez.
Melchior: Vamos
Baltazar, vamos seguir o Pastor. Eu acho que agora encontramos o caminho certo.
(Tiago e Simão aparecem).
Simão: Ouviu?
Acharam o que procuravam. Eu acho que deveríamos acompanhá-lo. Um novo rei,
quem sabe...
Tiago: Bobagem.
Nada disso foi afixado nos muros do palácio real, portanto, nada aconteceu. (Senta-se. Aparecem o comerciante e o
hospedeiro)
Hospedeiro: Já
querem partir, senhores? Que tal uma merenda? Uma garrafa de vinho? Pão?...
Melchior: Não
precisamos.
Comerciante:
Comprem lembranças de Jerusalém... tecidos... braceletes...
Gaspar: Era o que
faltava...
Baltazar: A cada
passo que damos, já vem alguém propondo negócios.
Melchior: Vamos,
antes que seja tarde. (Comerciante e hospedeiro ficam parados. Felipe vem.)
Felipe: Melchior,
espere, estou à sua procura...
Melchior: Você? À
minha procura?
Felipe: Ontem
estava irritado. Não podemos nos separar assim.
Melchior: Vamos!
Felipe: Estão me
acusando. Dizem que eu matei. Mas, você viu? Ele não queria negociar, você viu?
Melchior: Aman
está morto?
Felipe: Ontem,
quando ia para casa. Não se sabe como. Eu não sou o culpado. Se eu não tivesse
feito, outro faria. Não posso renovar o mundo enquanto outros não...
Melchior: Então espere até o juízo final.
Felipe: Para onde
vocês vão?
Melchior: Estamos
a caminho daquele que procurávamos.
Felipe: Então é verdade aquilo que você disse?
Melchior: Sim!
Felipe: Levem-me
junto.
Melchior: Venha.
Felipe: É longe?
Melchior: Provavelmente.
Felipe: Espere
um pouco, tenho que trocar de sapatos.
Baltazar: Vamos
indo...
Felipe: Vamos
amanhã, já está escurecendo...
Gaspar: Tanto
mais brilhará nossa estrela.
Felipe: Esperem.
Não posso ir agora. O que farão os meus empregados sem mim? Esperem até amanhã,
acharei alguém para assumir os meus negócios...
Melchior: Não,
nós vamos agora!
Felipe: Amanhã é
outro dia...
Gaspar: Nós vamos
agora!
Felipe: Amanhã...
Baltazar: Estamos
perdendo tempo... Vamos!
Melchior: Velho,
mostre-nos o caminho.
Pastor: O caminho
é longo e penoso. ( Os três saem com o
Pastor indo à frente. Os outros levantam e olham. O locutor fala enquanto os
outros desaparecem pelos fundos:).
Locutor: E a
estrela que viram no Oriente novamente os guiou até chegarem à estrebaria onde
estava a criança. Com os corações cheios
de júbilo, entraram na estrebaria e encontraram a criança ali, com Maria. E
Deus lhes ordenou, através de um sonho, que não mais voltassem à Jerusalém. E,
por outro caminho, voltaram à sua terra, anunciando os grandes feitos de Deus. (Apaga-se a luz).
OS HOMENS DO
ORIENTE
Autor desconhecido
Personagens:
Gaspar
|
Melchior
|
Baltazar
|
Pastor
|
Guarda
|
1º homem
|
2º homem
|
Comerciante
|
Hospedeiro
|
Felipe
|
Judite
|
Aman
|
Tiago
|
Simão
|
Ruth
|
Senhora
|
Locutor
|
|
Gaspar: Chega!
Nem um passo mais!
Melchior: Jerusalém!
Baltazar: Ali
está Jerusalém!
Gaspar: Doem-me
os pés Melchior. Vocês, venham cá e sentem-se debaixo desta figueira. Até
Jerusalém levaremos ainda uma hora.
Melchior: Atravessando
este vale estaremos lá, Gaspar. Sem dúvida a estrela nos trouxe a esta cidade.
Gaspar: Setenta
dias e setenta noites de caminhada...
Baltazar: E se a
estrela nos enganou, Melchior?
Melchior: Mas tu
não ouves o barulho das ruas da cidade?
Baltazar: Tudo
isso em honra ao rei que acaba de nascer! Parece música.
Gaspar: Experimenta
estes figos, estão gostosíssimos”
Baltazar: Eu
gostaria de voltar...
Melchior: Deixa
disso. Vamos lá!
Baltazar: Que
será ao vermos que não é aqui! Não vamos encontrar a quem procuramos. Esta é
uma cidade como tantas outras. A nossa
viagem foi em vão!
Melchior: Ela não
foi em vão! (Com ênfase) Uma cidade
como esta não se encontra duas vezes no mundo. Os seus sábios, os seus artistas
são famosos de Roma até o Oceano Índico.
Baltazar: Sim,
sim. Os seus mercadores vinham até nós e levavam o nosso ouro e nossas pedras
preciosas.
Melchior: Isso
foi no passado. Eu já conhecia esta terra antes. Grandes guerras a arrasaram.
Todos sabiam: Algo de novo virá! Precisa vir! Porque Deus haverá de lavrar a
terra para lançar nova semente.
Gaspar: E agora
vimos a sua estrela
Melchior: Por
isso, deve ser aqui...
Gaspar: Afinal,
porque Baltazar veio conosco? Sempre com essa idéia de voltar e não acreditar
no que dizem os sinais.
Baltazar: Por
favor, me entendam. Procuro e espero o rei com tanta ansiedade quanto vocês!
Sim, o rei mudará tudo... e tudo será diferente. Ninguém mais será afugentado de sua casa por
ser de outra cor ou por Ter outros pensamentos. Não haverá mais inimizade. Mas
eu tenho medo, medo de que aqui seja como em outras cidades.
Melchior: Nós
acharemos o rei recém-nascido, aqui em Jerusalém.
Baltazar:
Surgiram tantos reis falsos. Como vamos poder reconhecer se realmente é o
verdadeiro’
Melchior: Ora,
pelos homens que o seguem. Vem Gaspar, vamos caminhando.
Gaspar:
Caminhamos tanto. Será que não poderíamos descansar? Realmente, experimentes
estes figos... São gostosos... Vocês não estão com fome’
Melchior: Nós
vamos encontrar uma hospedaria...
Gaspar: Bem,
então vamos...
Pastor: Para onde
os senhores vão?
Melchior: O
senhor é desta região?
Pastor: Não
senhor. Algumas vezes eu pastoreio minhas ovelhas na região de Belém.
Baltazar: O
senhor poderia nos mostrar o caminho de Jerusalém?
Pastor: Por ali
há um atalho. Ali está o Getsêmani. É por ali que passa o caminho. É o único.
Baltazar: Obrigado
velhinho.
Pastor: Paz seja
convosco.
Gaspar: Está
escurecendo. Ali, olhem... a nossa estrela, lá!
Melchior: Dentro
de pouco tempo estaremos lá. (Ao saírem,
apaga-se a luz. O pastor volta ao seu lugar. Quando a luz acende, os três
entram pelo mesmo lado pelo qual saíram. O guarda entra pelo lado oposto. O
guarda fala militarmente).
Guarda: Quem são
vocês? De onde vem? O que querem em Jerusalém?
Baltazar: Nós
somos viajantes do Oriente.
Guarda: Que
mercadoria vocês estão trazendo?
Baltazar: Apenas
presentes para um recém-nascido. Estamos a sua procura.
Melchior: Viemos
para adorá-lo.
Gaspar:
Mostre-nos o caminho, por favor.
Guarda: Um
recém-nascido? Aqui reina o rei Herodes, há mais de trinta anos. Aqui não
nasceu rei nenhum...
Baltazar: Não?!
Gaspar: Certamente
o guarda ainda não sabe nada...
Baltazar: Não
saber que nasceu um rei? Claro que deve saber!
Guarda: Eu tenho
ordem de guarnecer o portão de Jerusalém. Além disso, nada mais. Por isso, não
me interessa se nasceu ou não um novo rei.
Baltazar: Mas
isso é algo extraordinário...
Guarda: O que é
importante, nós guardas sabemos. Nada nos foi comunicado. Portanto, não há novidade.
Melchior: Talvez
o novo rei não seja da casa de Herodes, mas sim de uma outra. Nós mesmos procuraremos.
Guarda: Vou
transmitir a intenção de vocês. Podem entrar. (O guarda volta ao seu lugar).
Gaspar:
Esquecemos de perguntar por uma hospedaria.
Melchior: Há
muita gente a quem podemos perguntar.
Baltazar: Gaspar,
Melchior, não vejo mais a estrela!
Gaspar: Baltazar
tem razão...
Baltazar: Ela
desapareceu desde que entramos na cidade.
Melchior: Nós já
vamos achá-la novamente.
Baltazar: Melchior,
vamos voltar ( em tom de lamento)! Ele não está aqui. (O 1º homem levanta-se do seu lugar e passa apressadamente. Pode estar
sentado na platéia e estar no palco).
Gaspar: Aí vem
vindo alguém...
Melchior: Com
licença, uma palavrinha só...
1º Homem: Que é
que há?
Baltazar: Procuramos
o rei recém-nascido...
1º Homem: Rei?
Céus... Diariamente nasce um rei: reis de futebol, reis do box e muitos outros.
Portanto, meu amigo, é só escolher!
Baltazar: Estão
vendo, este também não sabe de nada.
Melchior: Não, eu
acho...
1º Homem: Ah,
eu não posso esquecer o rei dos
velhacos, dos gatunos e patifes. Desculpem-me, lamentavelmente não tenho tempo
para conversas fiadas.
Gaspar: Calma, espere
um pouco... (1º Homem sai).
Baltazar: Por que
estará tão apressado?
2º Homem: (Entra apressado também).
Melchior: Ei, bom
amigo...
2º Homem: Não
tenho tempo, preciso ir ao templo.
Gaspar: Sim. Sim!
Ele certamente deve estar lá.
2º Homem:
Exatamente, um famoso pregador falará. Preciso me apressar. O templo está
sempre lotado. Desculpem-me, senão não conseguirei mais lugar. (2º Homem sai).
Gaspar: Será que
ele é tão religioso quanto aparenta?
Baltazar: Também
esse não sabia de nada. Eu não disse?
Melchior: Vamos
perguntar adiante. (O comerciante
aparece).
Comerciante:
Comprem alguns tapetes senhores. Tapetes da pérsia, tecidos da Índia. Ali está
a minha loja. Entrem lá e escolham. (O
comerciante leva alguns tapetes na mão, como mostra do produto. À medida que
vai falando, vai largando alguns tapetes aos pés dos homens do Oriente).
Baltazar: Não
procuramos nem tapetes, nem tecidos...
Melchior:
Procuramos o novo rei!
Comerciante:
Misericórdia! Um novo rei! Já temos trabalho sufocante com os nossos negócios. Não
precisamos de um novo rei... Aproveitem
e comprem tecidos da Arábia, tapetes da Pérsia. Estamos contentes porque tudo
está calmo novamente. Outros reis tem outras idéias e novas idéias geram
conflitos e agitação. Não queremos saber de novos reis... comprem tapetes...
Melchior:
Mentiroso. Aqui aconteceu algo. Pois, ao contrário as pessoas que encontramos
não teriam tanta pressa. Para onde estão indo? Uns mais apressados do que
outros...
Comerciante: Sei
lá! Negócios, talvez. Aqui sempre é assim.
Baltazar: Nós
pensávamos que a cidade estava em festa. Ao invés disso, encontramos os gritos
e berros de comerciantes e propagandistas.
Comerciante:
Comprem tapetes, senhores. Da Pérsia, tecido da Índia, preciosidades da Arábia...
Baltazar: Não
queremos comprar!
Comerciante:
Gente implicante, essa! (Sai. Enquanto
isso, o hospedeiro coloca uma mesa e cadeiras no palco).
Gaspar: Ali...
uma hospedaria... o hospedeiro está colocando uma cadeiras... Melchior,
Baltazar, caminhamos o suficiente hoje.
Vamos descansar um pouco. Além disso, tenho fome, muita fome...
Melchior: Bem...
Gaspar: Talvez
achemos também uma pousada...
Baltazar: Mas
somente por essa noite. Amanhã bem cedo voltarei para minha casa. (Vão até a mesa e sentam-se. Colocam suas
mochilas no chão).
Hospedeiro: O
Senhor seja convosco. Bem-vindos. A minha casa é a vossa casa. Os senhores não
querem vir até a cozinha e porão, que estão em condições de servir?
Gaspar: E o que
há nesta cozinha e nesse porão?
Hospedeiro: Tenho
assado de ovelhas, cuca, vinho do Vale do Jordão... Garanto que vocês vão
gostar...
Gaspar: Espero
que assim seja. Traga-nos algo para beber.
Baltazar: Acho
que a estrela nos enganou...
Melchior: Ela não
nos enganou. Nós todos vimos...
Baltazar: Então
me diga onde é que ela ficou? Sumiu! Não encontramos nada aqui além do que poderíamos
encontrar em outros lugares. Nada, nada, nada...
Melchior: Nem
tudo pode estar errado, pois nós só vimos a menos parte da cidade. Há ainda
outras vilas, outras ruas e outras pessoas. Vamos procurar adiante. Tenho um
amigo aqui em Jerusalém, Felipe. (O pastor entre, se aproxima da mesa e
começa a falar).
Pastor: Então,
senhores, encontraram o que estavam procurando?
Baltazar: Sim, o
caminho que nos trouxe até a cidade. Além disso, nada!
Pastor: Se eu
pudesse ajudá-los... (O hospedeiro se aproxima com a jarra e enche os copos9
Hospedeiro: Este
vinho é de primeira. Do Vale do Jordão. Doce como o mel, forte como o sol, fresco
como o luar.
Gaspar:
Vejamos...
Hospedeiro: (Ao pastor) Não fique aí parado,
velhinho!
Pastor: Eu sei!
Hospedeiro:
Desapareça daí!
Melchior:
Hospedeiro, o senhor conhece um homem chamado Felipe? Ele era auxiliar de um
negociante de especiarias...
Hospedeiro:
Felipe? Não será o grande Felipe? Oh, este não trabalha mais com ninharias. Ele
possui inúmeras caravanas que transportam mercadorias do Egito até a Índia. É
dono de um palacete situado á beira da estrada que vai para Damasco.
Gaspar: Ele sem
dúvida deve saber se há novidades aqui ou não.
Hospedeiro:
Felipe é a pessoa de maior influencia aqui. Metade de Jerusalém lhe pertence. (Ao pastor). Você ainda está aqui? Não
ouviu o que lhe disse?
Pastor: Ao menos
dê um copo de água para mim senhor. O
dia está muito quente...
Hospedeiro: Peça
aos seus anjos! Eles lhe darão água! Suma daqui! Eu estou lhe avisando pela última vez...
Gaspar: Aqui,
tome um copo de vinho...
Pastor: Muito
obrigada , senhor...
Hospedeiro: Está
bem, mas agora trata de desaparecer da minha frente, senão...
Pastor: Paz seja
convosco. (Sai)
Hospedeiro: Vou
dar uma olhada no assado de ovelha... Vocês vão se admirar... Deve estar quase
pronto! Ah...
Gaspar: Devíamos
ter perguntado ao pastor. Quem sabe ele poderia
ter dito alguma coisa...
Baltazar: O que
pode saber um simples pastor?
Melchior: Amanhã
procuraremos em toda a cidade. Irei à casa de Felipe. Ele nos ajudará.
Baltazar: Eu não
quero mais saber de nada. Eu desisto.
Melchior: Fique
Baltazar, ao menos mais um dia... Eu sei que vamos achá-lo
Gaspar: Já que
estamos aqui...
Baltazar: Eu sei,
eu sei, mas é tudo em vão...
Melchior: Fique, nós tentaremos...
Baltazar: (Convencido) Bem, mais um dia... (A luz se apaga. Quando se acende novamente,
Melchior está de frente para o público. Felipe coloca a mesa no palco, juntamente a uma cadeira, um pouco afastada
da mesa. Felipe senta-se e lida com papéis. Enquanto Felipe troca o cenário, Melchior
fala ao público).
Melchior:
Continuaremos procurando nesta cidade pelo rei, cuja estrela nós vimos. Irei à
casa do mercador Felipe. Vejo a sua casa, rodeada por um rico jardim. Há poucos
momentos chegou uma caravana de 40 camelos. Os trabalhadores carrega a
mercadoria. Ele está sentado contando os saco trazidos pela caravana. Vou
entrar. (Felipe levanta-se da cadeira
com uma bolsa na mão e está fazendo apontamentos).
Felipe: 30, 31,
32, 33, 34...
Melchior: Felipe!
Felipe: 35, 36,
37... não vês que estou ocupado? 38, 39... se o senhor tiver alguma oferta, não
estou interessado, não tenho
necessidade.
Melchior: Meu
nome é Melchior, venho do Oriente.
Felipe: Pode
ser... 40, 41... Já tivemos alguma correspondência?
Melchior: Há
muito tempo éramos amigos...
Felipe: Como é
mesmo o seu nome? Melchior?... Sim, eu me lembro. Faz muito tempo, não? Alegra-me ver-te. Como
vai você? Você teve muita sorte em me encontrar. Lamentavelmente logo
precisarei sair. 43, 44, 45... o que o traz aqui’
Melchior: Procuro
o rei recém-nascido.
Felipe: Sim, sim,
46, 47, 48, 49... Não, você fala sério?
O que você faz aqui em Jerusalém?
Melchior: Procuro
o novo rei dos judeus.
Felipe: Não faça
brincadeiras...
Melchior: Não,
nós vimos a sua estrela e estamos aqui para adorá-lo.
Felipe: Então,
eu... 50, 51...
Melchior: Ainda
não conseguimos encontrá-lo. Tu conheces Jerusalém. Não ouviste nada a respeito!
Felipe: Ouvir? De
que? Ah, sim, não! Nada, 52, 53, 54...
só sei que há muito movimento devido ao
recenseamento e é só. É uma loucura dos romanos. Todas as ruas estão entupidas.
Bom, quem viaja muito sempre gasta alguma coisa e para mim isso já é positivo.
52, 53, 54, 55... Vou abrir três bazares: em Javá, em Belém e Hidron.
Melchior: E não
houve nenhum comentário?
Felipe: Nenhum,
pode estar certo. Nesta cidade não acontece nada sem que nós comerciantes não
soubéssemos. Pois é, console-se, logo entraremos em negociações.
Melchior : Mas
Felipe, quem está falando em negócios?
Não são negócios que me trazem a Jerusalém.
Felipe: Isso eu
sei. Vocês do Oriente sempre começam dessa maneira: nos contam as mais variadas
histórias . 56, 57... e depois nos passam a perna... este arroz é o melhor que
há! Nenhum outro comerciante de Belém tem tantas qualidades como eu!
Melchior: Felipe,
ouça-me, por favor. Em todos os recantos do mundo sabe-se que algo de novo
virá, qualquer coisa, mas o quê? De onde? Por isso nós estamos em Jerusalém.
Felipe: Bem, aqui
não se vive mal... 58, 59, 60, 61... muitas coisas mudaram nos últimos tempo,
não é? Isso me orgulha! Você viu os meus jardins? Lindos, não?
Melchior: Sem
dúvida. Isso é magnífico, mas...
Felipe: É,
naturalmente isso não caiu do céu. Preguiçoso aqui não pode viver. Além disso, faz-se muitas coisas para as
pessoas que estão bem de vida.
Melchior: Em
outros lugares se faz muito mais! Não é isso! Os nossos corações é que estão
vazios e não as nossas mãos! Creia-me, procuramos o rei! Ajude-nos Felipe!
Felipe: 62, 63...
Judite: Felipe,
Aman de Hidro está aí.
Felipe: Não estou
em casa.
Judite: Mas ele
sabe que você está.
Felipe: Não tenho
tempo, preciso sair logo, além do que, tenho visitas, como você pode ver.
Judite: (A Melchior). Eu vi quando o senhor
chegou. (A Felipe) Mas o que será de
Aman? Você não pode mandá-lo embora...
Felipe: (Irritado) Não permito que minha esposa
se meta nos meus negócios. Não tenho tempo, diga isso a Aman.
Judite: Bem, se
você quer assim...(Sai)
Felipe: Horrível.
Todos querem alguma coisa. Pois é, Melchior, gostaria muito de te ajudar.
Realmente não faria mal se viesse outro rei. Talvez ele reduziria os impostos.
Quanto imposto você acha que eu pago por esses 60 sacos de arroz?
Melchior: Você
não me entende, Felipe. Você não recorda mais dos tempos que conhecíamos todos
os filósofos gregos e romanos? ... Como falávamos que algo novo deveria vir,
logo e que então nunca mais seria como o passado?
Felipe: Mas isso
foi há muito tempo...
Aman: (aparece) Felipe...
Felipe: Aman, o
que você quer? Você não ouviu que estou ocupado? Hoje não tenho tempo.
Aman: Só um
momento. Eu preciso de dois sacos de arroz e um de farinha para esta semana.
Felipe: E isso
precisa ser já?
Aman: Eu sempre
vinha a esta hora.
Felipe: Eu tenho
um hóspede...
Melchior: Eu vou.
Felipe: Fique.
Ele deverá ir.
Aman: E aqui
outro pedido...
Felipe: Não posso
fornecer...
Aman: Não pode
fornecer? Mas o depósito está cheio até em cima!
Felipe: Isso não
é da sua conta...
Aman: Eu preciso
de mercadoria. Do contrário vou perder a minha freguesia.
Felipe: Lamento
muito. Além disso, eu mesmo vou abrir um mercado em Hidron.
Aman: Felipe!
Felipe: Venha,
Melchior. Vamos ao jardim.
Aman: Isso não
pode ser verdade!
Felipe: Você acha
que eu minto?
Aman: Então nós
estaremos perdidos!
Felipe: Lamento
muito. Então você acha que eu vou esperar que outro faça isso em meu lugar?
Aman: Você,
Felipe, exatamente você precisa fazer isso?
Felipe: Por que
vocês não o fizeram, seus sábios comerciantes de Hidron?
Aman: Ninguém é
tão rico como você!
Felipe: Rico?
Preguiçosos é que vocês são. Preguiçosos. Pensaram em passar a vida sem fazer
nada. Este tempo passou.
Aman: Eu... eu...
(a Melchior) Senhor, eu... eu não o
conheço, ... mas o senhor ouviu. Eu lhe peço: faça algo por mim. Eu tenho
filhos.
Melchior: Se eu
pudesse lhe ajudar...
Aman: Felipe, seu
negócio já não é grande suficiente? Por que você quer aumentá-lo sempre mais?
Sempre mais e mais? Tenha misericórdia, Felipe!
Felipe: E quem
tem misericórdia de mim? Por acaso você está vendo estes sacos de arroz? Estes
fardos de lã? Você acha que eu consegui isso sem mais nem menos? Custaram-me muitos denários. De uma maneira
ou outra eu preciso progredir antes que os outros acabem comigo.
Aman: Mas por que
tudo isso? Por que?
Felipe: Porque é
assim e assim que deve ser. Aqui não existe porquê!!!
Judite: (Entra) Felipe eu ouvi tudo...
Felipe: Isso não
é da sua conta, portanto, não se meta.
Judite: Há muitos
anos que Aman é seu amigo...
Aman: Durante 20
anos eu vinha semanalmente e comprava as mercadorias.
Judite: Vocês
brincavam como crianças no pátio do templo. Os pais de vocês eram bons
amigos...
Felipe: Nesse
caso, não preciso ter amigos. E nem
posso. Amigos, amigos, negócios à parte. Onde se negocia, o sentimento e o
coração precisam ficar de fora.
Aman: Não vou
ficar quieto. Não! Vou gritar pelas ruas e anunciar que Felipe é assassino!
Felipe: (Sacudindo-o) Isso você não vai fazer.
Você conhece o comerciante de Hidron.
Aman: Você também
acabou com ele...
Felipe: Comprei a
empresa dele. A este negócio pertencem algumas promissórias de Aman de Hidron.
Eu seria capaz de rasgá-las. Mas se você
falar muito...
Aman: (Soltando-se) Faça o que você quiser... (Sai)
Judite: Felipe,
não deixe que ele vá embora. Aman é seu melhor amigo.
Felipe: Ele é um
palhaço. Não conhece os sinais dos tempos. Hoje em dia é preciso trabalhar com
muito lucro para não ir à falência.
Judite: Melchior,
peça-lhe para chamar Aman de volta.
Felipe: Isso eu
não admito. Você também quer se intrometer nos meus negócios Melchior?
Melchior: Eu não
disse nada...
Felipe: Eu quero
dizer uma coisa, seu santo que fala de tempos passados, novos reis e outras
coisas mais. Coma ou você será devorado. Sim, senhor. É assim mesmo. Sim, sim,
já sei o que você... vai dizer...
Melchior: Não vou
dizer nada.
Felipe: Vocês não
precisam me censurar, exatamente vocês...
Melchior: Eu
admiro você, Felipe.
Felipe: Por que?
Melchior: Você
não tem medo de que alguém lhe apresente um recibo que não pode ser resgatado
com arroz ou lã?
Felipe: Eu não
fiz nada de ilegal. Ah, o que estamos
dizendo? Nem vale a pena pensar nisso. Felizmente também não há tempo. Bom,
preciso ir.
Judite: Fique
,Felipe.
Felipe: Melchior
fica. Vocês podem trocar idéias e renovar o mundo com os sonhos de vocês. Enquanto
isso vou tratar dos meus negócios, pois precisamos viver.
Judite: Fique
Felipe.
Felipe: Não
posso, é importante, passem bem. (Sai)
Judite: Oh, é
importante... (senta-se na cadeira de
Felipe). É sempre tão importante que não resta tempo para conversarmos.
Antigamente a casa estava sempre cheia de amigos, mas agora... (Apaga-se a luz. Quando acende, Baltazar
encontra-se no palco).
Baltazar: Não
deveríamos Ter ido aos comerciantes. Por isso vou tentar com os escribas. Eles
são os professores do povo e conservam os livros. Se há realmente um novo rei,
então eles devem conhecê-lo.
Tiago: Não, não,
Simão, esse Jeobeão tem cada idéia...
Simão: Talvez,
Tiago, mas cada um pensa o que quiser, pois é livre.
Tiago: Cá entre
nós, Simão: diz-se que ele tem relações secretas com os persas.
Simão: Não ouvi
falar nada, será que isso está provado?
Tiago: Simão, eu
o admiro. Eu pensava que você fosse um dos nossos.
Simão:
Naturalmente, eu só acho...
Tiago: Além de
tudo ele quer assumir um posto na administração do nosso município.
Simão: Sim, você
tem razão. Talvez seria bom falar com Jeobeão, se pudéssemos convencê-lo...
Tiago: Falar com
ele por quê? Ele tem um mercado na estrada que vai para Javá ... deveríamos
falar, mas com cuidado...
Simão: Deveríamos
convencer nossos amigos a não comprarem mais no mercado dele. Vai ver como ele
muda de idéia.
Tiago: Se você
acha... (Baltazar entra)
Baltazar:
Saúdo-vos irmãos!
Tiago: Seja
abençoado. Em todos os casos esse
Jeobeão é um louco, precisamos fazer alguma coisa...
Baltazar: Eu vim
procurar um novo rei...
Simão: De onde
você vem?
Baltazar: Eu
venho das terras do Eufrates e do Tigre. Eu procuro...
Tiago: Parece que
há muita desordem por lá. Aqueles povos são dignos de compaixão. Então, satisfeito
por estar aqui?
Simão: Há muita
gente da terra de vocês aqui em Jerusalém.
Tiago: Tenha
paciência, qualquer dia as coisas vão melhorar
Baltazar: Eu
estou aqui para...
Simão: Muito
justo. Não é uma maravilha a nossa Jerusalém?
Tiago: Uma cidade
magnífica, não é? Vivemos felizes!
Baltazar: Isso eu
sei... procuro...
Tiago: Você não
sabe?
Simão: Que significa
isso?
Tiago: Se você
não gosta de nossa cidade, então vá morar em outro lugar, do outro lado do
Jordão e alimente-se de mel silvestre.
Baltazar: Não é
isso que eu procuro...
Simão: Auxílio.
Nós compreendemos. Estamos dispostos a ajudar.., não é Tiago?
Tiago:
Naturalmente, e com prazer. Exigimos apenas que você se submeta aos nossos
conselhos.
Baltazar: Que
significa isso? Eu vim porque procuro algo e vocês querem me comprar?
Tiago: Ouça só
que ingratidão. A gente se prontifica a colaborar com estes miseráveis... Você
deve compreender que nada podemos começar com pessoas que mais tarde seguem seu
próprio caminho.
Baltazar: Ouçam-me,
por favor. Eu vim procurar o novo rei. Nós vimos a sua estrela.
Tiago: Um novo
rei?
Simão: Céus! Não
sabemos de nada!
Tiago: E nós
seríamos os primeiros a sabê-lo...
Baltazar: Nós
lemos os livros de vocês e vocês também falam ali de um novo rei.
Simão: Sim, na
escritura. Certamente você não entendeu o que leu.
Tiago: Você tomou
tudo ao pé da letra...
Baltazar: Mas, é
preciso tomar tudo ao pé da letra. Senão , não teria nenhum sentido.
Tiago: Um
problema interessante. Deveríamos escrever um livro sobre isso. Bem, caro
amigo, nosso tempo está esgotado (Simão e
Tiago levantam).
Simão: Precisamos
ir à reunião. Será feita uma crítica
contra a violência.
Tiago: No outro
lado do Jordão. Você compreende? Mais
tarde, talvez.
Baltazar: Nunca
mais. Aqui eu não vou procurar o que eu procuro. Disso eu tenho certeza. (Sai).
Tiago: Você não
acha esquisita essa conversa de novo rei?
Simão: Pois é,
quem procura novidades aqui em Jerusalém é suspeito. Vamos. (Apaga-se a luz. Quando acende, Gaspar
encontra-se só no palco. Enquanto ele fala, Ruth senta-se no chão e brinca com
uma bola).
Gaspar: O rico
comerciante não sabia de nada. Os escribas muito menos ainda. Agora vou tentar
com os miseráveis, estes ao menos tem o
coração no lugar certo. Os grandes não querem saber de muitas coisas, mas os
pequenos tem compreensão para tudo.
Amon, o tecelão sabe o que se fala no tear e nas tabernas. Aqui está a sua casa. Ele não está. Mas aqui
está sua filha... está brincando...
(Aproxima-se de Ruth e fala calmamente). Eu procuro seu pai, Amon, o
tecelão. Sabes onde ele está?
Ruth: (Sem olhar
para Gaspar) Não!
Gaspar: E sua
mãe?
Ruth: Não!
Gaspar: E quando
vão voltar? Sabe?
Ruth: Não. (Gaspar vira-se para ir embora). Eu sei
onde estão.
Gaspar: Onde?
Ruth: Trabalhando.
Gaspar: Os dois?
Ruth: Sim, mamãe
volta logo.
Gaspar: Vou
esperar. Vamos brincar um pouco? (Senta-se
no chão, abre os braços esperando a bola).
Ruth: Não!
Gaspar: Eu não
vou te morder...
Ruth: Eu não
brinco com você.
Gaspar: Por que
não?
Ruth: Você não
quer me levar?
Gaspar: Eu?
Levar? Quem foi que lhe disse isso’
Ruth: Quando não
me comporto, mamãe sempre me diz que um negro vai me levar.
Gaspar: Dizem
isso na sua casa? Não, eu não quero levar você. Quero só brincar.
Ruth: Você é do
circo? (Joga-lhe a bola)
Gaspar: Não, eu
não sou do circo.
Ruth: Você não
mora na selva com as feras?
Gaspar: Mas quem
lhe contou tudo isso?
Ruth: Mamãe!
Gaspar: Moramos
em cidades como vocês. Usamos as mesmas roupas.
Ruth: Lá todos
são pretos?
Gaspar: Sim, isso
sim.
Ruth: Só os maus
são pretos?
Gaspar: Eu sou
mau?
Ruth: Não! Lá não
há feras que comem a gente?
Gaspar: Há sim,
mas não nas cidades. Somente longe, fora da cidade.
Ruth: (Aproximando-se de Gaspar) Que animais?
Gaspar: Bem, que
animais? Há, por exemplo, o leão. Você conhece?
Ruth: Não.
Gaspar: Ele tem
uma juba, como as crianças que não querem cortar o cabelo.
Ruth: Ah...
Gaspar: Quando
tem fome ele ruge.
Ruth: E quando
não tem fome?
Gaspar: Daí,
naturalmente, não.
Ruth: O que tem
mais?
Gaspar: A girafa
que tem pescoço comprido.
Ruth: Mais,
mais...
Gaspar: Tem o
elefante que tem uma longa tromba. Tem o crocodilo que mora na água...(Não notam
que a mãe de Ruth entra)
Senhora: Ruth!
Ruth: Mãe!
Senhora: Venha
imediatamente!
Ruth: Ele está
contando histórias!
Senhora: (Toma Ruth pelo braço para levá-la embora.
Gaspar levanta). Você não pode Obedecer? (Vira-se para Gaspar). Pelo menos respeite os filhos dos outros...
Gaspar: Estou à
espera de Amon, o tecelão e ...
Senhora: Então
espera em vão...
Gaspar: Talvez
ele pudesse me ajudar. Eu procuro...
Senhora: Ele não
está.
Gaspar: Vou
esperar...
Senhora: Como
quiser. Mas não na minha casa. Além disso, eu não sei o que o senhor tem a ver
com meu marido. (A Ruth) E fique
sabendo, Ruth, eu não quero que você fale com quem não conhece. Vamos lá, lavar
suas mãos!
Ruth: Minha
bola... (Gaspar lhe entrega a bola. Apaga-se a luz. Quando acende, volta a cena
da hospedaria).
Melchior: Então,
o que mais você encontrou?
Baltazar: Nada.
Pastor: Deus vos
abençoe, senhores.
Baltazar: Você
chegou em boa hora, velho. Agora mostre a saída, o mais depressa possível,
certo?
Pastor:
Encontraram o que estavam procurando?
Baltazar: Não!
Gaspar: E não
vamos procurar mais...Desistimos.
Pastor: Onde
vocês procuraram? Nas ruas iluminadas? Nos palácios? Vocês tem que procurar nos
arredores.
Gaspar: Não vamos
mais dar nenhum passo, velho.
Melchior: Falsos
reis, desses achamos um monte.
Pastor: Pastoreio
minhas ovelhas nos campos de Belém...
Baltazar: Chega,
esta história você já contou uma vez!
Pastor: Posso
mostrar o caminho que estão procurando.
Baltazar: Não
dêem atenção ao velho...
Pastor: Um anjo veio e me levou...
Baltazar: Chega e
cala a boca. Não acreditem no que ele está dizendo. Não quero ser enganado pela
Segunda vez.
Gaspar: Vem,
Melchior, nós achamos a saída sem a ajuda de ninguém.
Melchior: Deixem
ele falar. Quero ouvir o que ele tem a dizer. (O guarda aparece)
Guarda: Alto!
Vocês são os três do Oriente?
Gaspar: Somos
nós, sim, e já estamos voltando para lá.
Guarda:
Comuniquei a Herodes o que querem aqui, que estão procurando um recém-nascido.
Baltazar: Foi um
engano, realmente um engano.
Guarda: Herodes
deseja conhecê-los. Ele quer que comuniquem a ele assim que acharem o
recém-nascido.
Baltazar: Pode
falar ao seu rei que pode ficar tranqüilo.
Nada de novo aconteceu em Jerusalém.
Gaspar: Vamos.
Melchior: Muito
interessante.
Baltazar: O quê?
Melchior: Herodes
crê que poderia ser realmente verdade, senão não teria mandado o guarda.
Pastor: Venham
comigo senhores.
Melchior: Para
onde nos levas?
Pastor: É uma
casa pobre. Uma estrebaria. Uma manjedoura.
Baltazar: Que
consideração! Aqui mora-se em palácios, um maior que o outro. E o rei numa estrebaria?
Nunca, nunca, Melchior. Você não vê que ele está nos enganando?
Pastor: É um
caminho penoso...
Gaspar: A
estrela... a estrela apareceu novamente!
Baltazar: Sim!
Gaspar:
Exatamente quando o velho falou da manjedoura, ela apareceu.
Melchior: Este é
o sinal. Mostra-nos o caminho!
Gaspar: Vamos
tentar mais uma vez.
Melchior: Vamos
Baltazar, vamos seguir o Pastor. Eu acho que agora encontramos o caminho certo.
(Tiago e Simão aparecem).
Simão: Ouviu?
Acharam o que procuravam. Eu acho que deveríamos acompanhá-lo. Um novo rei,
quem sabe...
Tiago: Bobagem.
Nada disso foi afixado nos muros do palácio real, portanto, nada aconteceu. (Senta-se. Aparecem o comerciante e o
hospedeiro)
Hospedeiro: Já
querem partir, senhores? Que tal uma merenda? Uma garrafa de vinho? Pão?...
Melchior: Não
precisamos.
Comerciante:
Comprem lembranças de Jerusalém... tecidos... braceletes...
Gaspar: Era o que
faltava...
Baltazar: A cada
passo que damos, já vem alguém propondo negócios.
Melchior: Vamos,
antes que seja tarde. (Comerciante e hospedeiro ficam parados. Felipe vem.)
Felipe: Melchior,
espere, estou à sua procura...
Melchior: Você? À
minha procura?
Felipe: Ontem
estava irritado. Não podemos nos separar assim.
Melchior: Vamos!
Felipe: Estão me
acusando. Dizem que eu matei. Mas, você viu? Ele não queria negociar, você viu?
Melchior: Aman
está morto?
Felipe: Ontem,
quando ia para casa. Não se sabe como. Eu não sou o culpado. Se eu não tivesse
feito, outro faria. Não posso renovar o mundo enquanto outros não...
Melchior: Então espere até o juízo final.
Felipe: Para onde
vocês vão?
Melchior: Estamos
a caminho daquele que procurávamos.
Felipe: Então é verdade aquilo que você disse?
Melchior: Sim!
Felipe: Levem-me
junto.
Melchior: Venha.
Felipe: É longe?
Melchior: Provavelmente.
Felipe: Espere
um pouco, tenho que trocar de sapatos.
Baltazar: Vamos
indo...
Felipe: Vamos
amanhã, já está escurecendo...
Gaspar: Tanto
mais brilhará nossa estrela.
Felipe: Esperem.
Não posso ir agora. O que farão os meus empregados sem mim? Esperem até amanhã,
acharei alguém para assumir os meus negócios...
Melchior: Não,
nós vamos agora!
Felipe: Amanhã é
outro dia...
Gaspar: Nós vamos
agora!
Felipe: Amanhã...
Baltazar: Estamos
perdendo tempo... Vamos!
Melchior: Velho,
mostre-nos o caminho.
Pastor: O caminho
é longo e penoso. ( Os três saem com o
Pastor indo à frente. Os outros levantam e olham. O locutor fala enquanto os
outros desaparecem pelos fundos:).
Locutor: E a
estrela que viram no Oriente novamente os guiou até chegarem à estrebaria onde
estava a criança. Com os corações cheios
de júbilo, entraram na estrebaria e encontraram a criança ali, com Maria. E
Deus lhes ordenou, através de um sonho, que não mais voltassem à Jerusalém. E,
por outro caminho, voltaram à sua terra, anunciando os grandes feitos de Deus. (Apaga-se a luz).